Depressão

sexta-feira, junho 13, 2014 Rica Matsu 2 Comentarios

Oi amigos! Me desculpem pelo sumiço. Uma sucessão acontecimentos e problemas de saúde me levou a depressão. Estou retomando minhas atividades aos poucos. Quem já conviveu com a doença sabe como é difícil superar este estado imobilizante. Infelizmente ou não, é o que estou vivendo no momento e estou criando forças para vencer. Ainda esse ano vai sair o meu livro Fenixidade. Enquanto isso, vou escrevendo mais e mais sempre com algum propósito que possa trazer mais leveza a vida de todos nós. Este artigo é totalmente autobiográfico. Dedico para todos aqueles que tem depressão, ansiedade, ou qualquer outro transtorno que rouba nossa paz. Saiba que você não está sozinho.



Minha memória nunca esteve tão ruim, não consigo me concentrar de jeito nenhum. Dores aleatórias no corpo inteiro vêm e vão, sem aparecer nos exames. Náusea, enjoo, enxaqueca, nó na garganta. É frequente a sensação de estar completamente oco; o casco de alguém um dia preenchido. Um manequim de loja parece ter mais vida do que eu. Mais cor, brilho nos olhos e vida social. Todas as coisas que eu gostava de fazer conheceram a indiferença. Quem me olha tem a impressão de que deixei de amar as coisas, as pessoas, o mundo. Sinto uma cegueira no tato, uma angústia velada. Sair da cama é um tremendo sacrifício. Sem motivação para nada. Acho que sei dar aula de incapacidade! Isso é o resumo do monstro que me ataca, chamado Depressão.

Sou daquelas pessoas que sorriem fácil, mas quando se repara bem no fundo dos olhos vê-se uma tristeza talvez irreparável. Passei muito tempo da vida assim, consciente ou não, tentando esconder a melancolia que hoje não quer mais ficar calada. Desde a infância me sentia assim. No início pensei que com o tempo logo passaria. Acabei me acostumando com o “modo tristeza” sempre ligado, apesar de aparentemente tudo ocorrer de forma normal na minha vida.

Acontece que de tempos em tempos essa disforia tomava conta de mim de forma severa. Eu me isolava na tentativa de me livrar do problema, como quem se abriga numa árvore para escapar da chuva. Me sentia sozinho e diferente das outras pessoas. Me sentia fraco. Porém, não podia demonstrar isso diante dos outros, da família, amigos e da sociedade, tal qual precisamos estar sempre adequados, dentro de padrões chamados “normais”. Demonstrar fragilidade ou certa diferenciação não é coisa bem vista. Ainda mais para quem tem no DNA o gene nipônico de ser sempre forte (de fato, aguentamos mais a dor). Mas a questão vai muito mais além. Fatores bioquímicos, psicológicos e ambientais fazem parte das causas da depressão. Até hoje não se pode afirmar que existe cura. Deprimidos podem ter que conviver com a doença pelo resto da vida. Aí estava eu vivendo sob um manto negro, uma sombra invisível.


O monstro escondido

Durante meu recente quadro de depressão, após vários anos negligenciados, consegui enxergar de forma mais consciente meu interior. E, antes de mais nada, tive que aceitar a condição de doente depressivo para poder prosseguir na busca da cura. É o primeiro passo. Até o momento não aceitava isso. Não é nada fácil assumir que tem um transtorno mental. Que precisa de terapia, que vai ao psiquiatra. Ou ainda, que toma remédio “pra cabeça”. Existe um preconceito muito grande sobre o assunto. Fere o orgulho. É se expor demais para a sociedade moderna que estabeleceu a tristeza como algo errado, feio, quase indigno. Ela ordena que você sempre esteja feliz.

A maioria das pessoas não expõe suas fraquezas, dores e tristezas. Pode ser humilhante ou demonstra incapacidade. A sociedade é implacável com quem está fraco e infeliz. Prega a obrigação de manter o sorriso estampado no rosto. Quando está triste há algo errado com você, diz o senso comum. Só é permitido estar feliz. Sendo assim, para não se sentir inferior diante dos supostamente felizes, a gente acaba negando o estado depressivo. Mas a tristeza é necessária. A melancolia pode nos revelar o valor real das coisas, dos relacionamentos e da relação consigo mesmo. Não que tenhamos que sair por aí choramingando pelos cantos. Ser ou estar triste faz parte da natureza do ser humano e não pode ser atributo de inferioridade.

Para homens com depressão a situação é mais complexa. Qual pai de família vai admitir que está deprimido? Isso é coisa de mulherzinha. É contra o ego do macho alfa. Demonstra sensibilidade reprimida, ataca o orgulho e a reputação do homem que não chora. Existem mais mulheres com depressão ou homens com problema de coração? O fato é que assim foi instituída na sociedade uma espécie de vergonha em assumir nossas fragilidades.


Vai passar...

Ao contrário do que se supõe, depressão não é apenas estado passageiro ou uma fase que logo termina. Muitos evitam o assunto, dizem que é frescura ou falta de ocupação. E é claro, o julgamento mais comum: falta de deus. Fala-se muito em falta de deus e fico pensando se não seria deus em falta. Já dizia Nietzsche: “Deus está morto.” Depressão não é simplesmente ter alguns dias ruins ou falta de reza. É uma doença complexa ainda não conhecida por completo. Não possui causa específica. O não saber lidar de pessoas próximas, da família e inclusive do próprio doente pode agravar o quadro.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a depressão já é a 3° doença mais incapacitante do mundo e até 2020 terá alcançado o topo do ranking. No mundo contabiliza-se cerca de 350 milhões de deprimidos (5% da população) e só no Brasil, quase 10% da população sofre do transtorno.

Segundo pesquisa de capa divulgada pela Revista Super Interessante (junho 2013) de cada dez pessoas que apresentam o transtorno, apenas três procuram ajuda. Isso revela uma grande consequência confirmada pelos dados da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em que 90% das tentativas de suicídio são motivadas por doenças mentais não diagnosticadas ou mal tratadas. Dados da OMS mostram que o número de suicídios no mundo cresceu 60% nos últimos 45 anos. Cerca de 3 mil pessoas tiram a própria vida todos os dias; 60 mil tentam, mas não conseguem. O problema está entre as três principais causas de morte entre pessoas de 25 a 44 anos. Fonte: www.dentrodenos.com.br.

Mesmo com dados tão alarmantes a depressão ainda é um tabu. Felizmente, existem tratamentos que aliviam os sintomas para que o deprimido possa mudar sua realidade e ter uma vida mais feliz.

Aí você deve estar se perguntando como estou conseguindo escrever de forma tão consciente sob um estado tão incapacitante como esse. A resposta é consciência e tratamento. Na depressão ou em qualquer transtorno mental não dominamos a mente; ela é que nos domina. Transtorno bipolar, ansiedade generalizada, pânico, TOC são umas das várias personas dessa mente poderosa que temos. E ao invés de sermos nós mesmos - o eu verdadeiro - nos tornamos nossa mente. Viciada em pensamentos ela é destinada a nos adaptar a qualquer custo na sociedade doente atual. Antes de minha recente recaída na depressão, eu buscava informações sobre autoconhecimento para levar uma vida com mais propósito. E foi assim que encontrei um texto sobre algo como “o Eu observador”. Acho que consegui aplicar um pouco disso em mim mesmo. Foi como uma pequena brecha de luz que se abriu no meio de tanta escuridão. As causas da minha depressão ainda estão aí em pleno combate comigo. Sei que elas não vão sumir de uma hora para outra. Mas o reconhecimento de tudo isso me dá agora a oportunidade de assumir o comando.


O autoanjo

Se observar dessa forma é um exercício para sair do estado entorpecido que a depressão impõe - nem que seja só por um instante. Consiste em desligar a mente e se observar. Assistir “do lado de fora” como você age, pensa e sente. Porém, sem julgamentos. É como se dentro de você existisse um pequeno eu que sai do corpo e fica como um anjo a observar o seu protegido. Ele não faz nada mais além te observar e perceber como você funciona no automático. Não julga, não atribui rótulos ou valores de certo e errado. Ele apenas quer cessar seus pensamentos para que você possa ter uma visão mais consciente de si mesmo, e assim buscar o autoconhecimento necessário para identificar certas programações mentais que nos sabotam sem que a gente perceba.

Conseguindo isso vai começar um processo de sair da posição de vítima impotente para buscar alternativas de cura, agindo contra o que deprime. Vai saber o tamanho do amor que sente por você mesmo. Esse processo é muito difícil e solitário. Às vezes o fazemos inconscientemente, ou temos um pequeno vislumbre, como por exemplo, quando paramos o choro para respirar ao se debulhar em lágrimas. É como pensar enquanto se prende a respiração. Essa parte é a consciência, a aceitação de si mesmo do jeito que é.

Ferramentas de cura

Apesar de consciente depois de ter aceitado que tem depressão, é tendencioso resistir a tratamentos como psicoterapia e antidepressivos. O senso comum também nos diz que é coisa para loucos, ou mesmo pelo medo ficar dependente de remédios. Há muita conversa sobre esse tipo de tratamento que é pouco esclarecido, uma vez que o preconceito e falta de informação acabam diminuindo sua importância em detrimento da cura. Por experiência própria, sei que tomar um antidepressivo pode ser fundamental para obter a motivação necessária e sair do estado de paralisia.

Por mais suporte que a família e os amigos possam nos dar, a terapia pode te dar o norte para a cura clareando o caos de pensamentos ansiosos de uma mente depressiva. O psicólogo tem uma visão de fora do contexto. Desta forma, faz você refletir e pensar sobre o problema através de intervenções neutras. A psicologia e a psiquiatria são as ferramentas que a ciência nos dá para curar a depressão. Os dois juntos estão me fazendo movimentar.


Nada vai funcionar sem ação. Nada!

Quando estamos em estado depressivo agir é um martírio. Aturar situações de estresse e até mesmo conviver com as pessoas nos deixa ainda pior. O único desejo é desaparecer. Se houvesse um abismo infinito era aonde iria querer me jogar. Essa é a sensação. É um pensar em não fazer mais nada para sempre. E não tem como sair disso se não usar alguma dessas ferramentas. Consciência, tratamento, ação. Uma coisa auxilia a outra para sair desse buraco de areia movediça. Consciente e medicado você vai ter SIM uma abertura para agir, levantar e prosseguir. Só assim vai haver força para domesticar a depressão. Controlá-la. Alcançar a cura. Nessa oportunidade de ação é que se pode lançar mão de todas aquelas dicas dos médicos: fazer atividade física, se alimentar bem etc. É o início do caminho para recuperar o ânimo, o gosto pelas coisas que se costumava fazer, a energia perdida, o amor pela vida. A ação é o que vai colocar o processo de cura para funcionar de modo concreto. É a possibilidade de se reconstruir.



Esses são os passos que tenho dado para buscar a cura. Só quem tem sabe como é viver com depressão. É difícil explicar, é difícil pra quem está perto saber como lidar. Espero que esse texto ajude outras pessoas que compartilham comigo este lugar onde as nuvens são sempre escuras, onde a chuva não para. Procure este “autoanjo observador” dentro de você. Ele é o que me permite escrever agora e colocar a cara um pouco fora do buraco.

E claro, conte com as pessoas especiais em sua vida, pois, nada é mais importante do que isso! Então, muita força e obrigado por ler.

rica


2 comentários:

  1. Oi Rica...estou neste momento passando por tudo isto e realmente da vontade apenas de desaparecer...Estou fazendo terapia, mas acho que não vai ter jeito, vou ter que tomar um remedinho, as nuvens estão muito carregadas. Da uma vontade desesperadora de achar algo ou alguém para culpar, mas quando fazemos realmente uma auto-observação percebe-se que o problema não vem de fora. gostei da sua colocação sobre como a sociedade cobra o etsar bem, as vezes me pego pensando que é coisa da minha cabeça essa falta de aceitção...as vezes você tenta desabafar, as pessoas te dizem...mas você tem tudo...não existe motivo para estar assim, isso me faz sentir ainda pior, como se fosse proposital o quadro depressivo, como se eu estivesse me fazendo de fraca...Me confortou um pouco ler este texto.

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    1. Oi! Fico muito feliz que o texto te deu algum conforto. As pessoas não entendem como a depressão nos afeta. É realmente muito complicado porque é uma coisa silenciosa. Não sai em exames, nem é possível colocar gesso na parte "avariada". Aí todo mundo pensa que estamos de frescura ou algo do tipo. O que piora mesmo o estado. O que posso te dizer é que hoje consegui controlá-la justamente com essa auto-observação. Este autoconhecimento nos livra de muitos mitos e nos faz mais fortes para enfrentar e chegar a cura. Relutei muito pra tomar remédio e tive duas experiências: a primeira é que comecei a tomar e logo depois da "melhora" achei que estava bem e parei antes do tempo. E a segunda é que voltei a tomar, porém como outra consciência. Muito se fala em dependência de medicamento ou tomar para a vida inteira... O que pude constatar é que o remédio é uma ferramenta fundamental para sair dessa escuridão. Só que é preciso saber que ele não basta e nunca irá bastar, a não ser que você trabalhe a raiz do problema, o seu interior. Ele vai te ajudando a não ficar down, até que você consiga resolver todos os males internos. E quando essa liberdade chegar dentro de você, dizer adeus aos remédios, terapias será muito fácil. A tristeza é necessária na nossa vida, mas as pessoas vivem na ilusão de que precisam ter sempre esse sorriso no rosto para ser alguém, para mostrar que é forte, para conseguir um trabalho.
      Se eu fosse te dizer algo para te dar um pouco mais de conforto seria que não importa o que as pessoas digam, família, amigos, sociedade, todos. O que importa é que você é única nessa existência e está aqui pra ser feliz, com muitos obstáculos, claro, mas para encontrar essa felicidade em você mesma. Se nós chegamos a um estado em que está difícil de aguentar é porque no mínimo nos não nos conformamos com essa vida medíocre que a sociedade vive. Hoje, sem brincadeiras, eu agradeço por ter chegado a minha pior crise de depressão, porque me fez acordar e renascer para um mundo mais feliz que eu mesmo escolhi. Você vai sair dessa. Esse anjo observador me ajudou muito, me ajuda ainda. Te desejo essa transformação!!! Abraços!

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