9º dia: O Bancário e o Esqueitista
Brasília é uma cidade feita sob medida e
separada por setores de tudo quanto é coisa. Tem setor hoteleiro, setor
comercial, setor de diversões, setor de transporte e abastecimento; tem
até setor de postos e motéis. Sua arquitetura peculiar - quase egípcia
- dividiu o centro em duas “asas”, sul e norte. Um setor bastante
movimentado é o Setor Bancário Sul. E é neste cenário que existe um contraste
curioso ao caminhar pelos seus amplos espaços cor de concreto, repletos
de edifícios vaidosos.
No caminho para o trabalho, por volta de oito
da manhã, ando junto a outros trabalhadores vindos da estação do metrô. Ao chegar
na quadra, passo entre os diversos bancários dispersos entre um prédio e
outro, ao lado de bancas de frutas e quiosques. Em qualquer direção que se
olhe, não é difícil distingui-los: roupas sociais, cabelos cortados e gravatas
medalhosas. Tabletes e smartphones saltam de seus bolsos como tamagochis famintos. As pontas de cigarros
entre os dedos marcam o procrastinado início de expediente.
Espalhados, agrupados, sentados no chão e vez
em quando, também, no meio da fumaça; cabelos variados, multiétnicos,
bermudas largas e tênis chapados aparecem na multidão. Bonés, cordões
estilosos, gírias e cumprimentos fraternos deslizam sobre os shapes ao longo do trajeto. Lá estão
eles, os esqueitistas! Jovens de todas as idades, estilos e cores de
fones. É impossível passar por ali sem perceber o constante estralar de
rodinhas no chão.
Desanimados para encarar mais um dia burocrático-entediante,
os bancários com suas barrigas feridas, levam à boca seções alternadas
de refrigerante e junk food. Assistem todo dia os saltos
das contas bancárias, mesmo que isso provoque a queda de seus cabelos e de
suas autoestimas. De vez em sempre, discutem o cotidiano de suas repartições
nos protestos sobre aumento de salário e redução de jornada
de trabalho.
Que paradoxo de vida perturbador! Os
que lidam com o dinheiro parecem viver intensamente a letargia,
enquanto os ociosos são exemplos vivos de superação, persistência,
dedicação e coragem. Incansáveis, os meninos e meninas madrugam para
chegar até lá e começar uma jornada de saltos repetitivos, perigosos e fraturantes.
Ultrapassar os limites é algo tão natural nesses garotos! No meio
do caos executivo, eles continuam a rodar numa espécie de transe.
É incrível ver os Peter Pans suicidas em estado de meditação
Kurt Cobain.
Não sei que tipo de música bancário escuta.
Mas, seria bom começar a escutar Charlie Brown Jr. o mais rápido possível!
rica

 









 



 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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